quarta-feira, 24 de outubro de 2012


Epoché

Conferência na Associação dos Arqueólogos Portugueses – secção de Pré-história

Lisboa, Museu Arqueológico do Carmo, quinta-feira 25 de Outubro de 2012 – 18 horas – entrada livre

Tema:
ALGUMAS PROPOSTAS PARA UM ENCONTRO URGENTE: Arqueologia e Pensamento Crítico Contemporâneo


por Vítor Oliveira Jorge

Alguns tópicos prévios…
“(…) a verdade é parcial, só acessível quando se toma partido, e não deixando por isso de ser universal.”
……
“Esta pergunta [a implícita no título de um célebre livro de Benedetto Croce sobre Hegel – “O Que Está Vivo e o Que Está Morto na Filosofia de Hegel”, 1907] pressupõe, da parte do autor [Croce], a adopção de uma arrogante atitude de juiz do passado [Hegel]; mas, quando estamos perante um filósofo realmente grande, a verdadeira questão a pôr não se refere ao que esse filósofo poderá ainda dizer-nos, poderá ainda significar para nós, mas antes a oposta: ou seja, que seremos nós, que poderá ser a nossa situação contemporânea, aos olhos dele, como aparecerá no seu pensamento a nossa época?”
Slavoj Zizek, “Da Tragédia à Farsa”, Lisboa, Relógio d’ Água, 2010, p. 14
_
Há quarenta anos, mais ou menos, que milito nesta ideia: a de que a arqueologia deve, como qualquer outro campo do saber/actividade profissional, inserir-se de pleno direito (e também com a consciência de que isso é um dever incontornável) nos grandes problemas “filosóficos” (para não dizer, nos grandes debates político-ideológicos) contemporâneos. Isso exige de nós evidentemente um esforço intelectual acrescido, e que é também um dever ético.
Quando Paulo Tunhas, num livro recente (“As Questões Que Se Repetem”, Lisboa, D. Quixote, 2012, p. 11), se refere às origens da filosofia, ao que esta fundamentalmente é, diz: “Mas é com os gregos que se acrescenta à interrogação sobre a origem do cosmos aquele que é o acto inaugural da filosofia: uma reflexão sobre o próprio acto de pensar e sobre a origem do pensamento no espanto, ou maravilhamento, com a própria existência de um mundo ordenado, de um cosmos.”
Ora acontece que, num sentido não especializado, nem só os filósofos “fazem” filosofia. Se ela é uma reflexão sobre o próprio acto de pensar, então qualquer investigação, e, por extensão, qualquer actividade humana, porque envolve pensamento, deve implicar cedo ou tarde uma reflexão, não só sobre si própria (epistemologia interna, por assim dizer), mas também sobre questões inter e transdisciplinares que o seu objecto levanta a nível mais geral (epistemologia externa, passe a expressão).
A chamada “arqueologia pré-histórica” está na interface das chamadas ciências naturais e ciências sociais, uma vez que o próprio conceito (muito discutível, é óbvio) de “pré-história” nos coloca aqui desde logo perante um problema: que é isso de uma história anterior (“pré”) à própria história? Que significado tem pesquisar um “antecedente” sempre em recuo, sempre mais longínquo, na obsessão de preencher um vácuo fundamental, na própria tentativa de perceber “definitivamente” quem somos? Para que noção continuista, cronológica, convencional, de tempo linear, sub-dividido em períodos, desde logo aponta esta nossa demanda?
Mas mesmo a palavra arqueologia, à letra, ciência da “archè” (origem, fundamento, princípio legitimador de algo) não é nada pacífica, uma vez que parece pressupor uma busca de uma essência, de um princípio das coisas, que temos de compreender no contexto histórico muito preciso em que emerge: Ocidente, modernidade, racionalismo, invenção da ideia de património, alargamento da noção de documento histórico à realidade material, extensão da noção de tempo histórico, etc, etc.
Neste sentido, a “pré-história” poder-se-ia considerar o domínio mais “puro” da própria arqueologia, de algum modo o seu extremo limite inicial, na medida em que procuraria as origens de um fundamento anterior a qualquer registo escrito. Não é assim de admirar que a maior parte dos trabalhos no âmbito da “teoria” da/na arqueologia tenham sido escritos por “pré-historiadores”, como é bem conhecido. Os “arqueólogos das épocas históricas” habitualmente reportam-se à “teoria da história” e, portanto, a toda uma outra genealogia de reflexões.
Realmente, a arqueologia pré-histórica, ou, se se quiser, a pré-história, parece que teria a missão de preencher um vazio entre a natureza e a cultura/civilização, entre a animalidade e o homem, isto é, de criar um nexo narrativo/temporal/causal para a emergência de nós próprios, humanos, como seres “domesticados”, pensantes, reflexivos, imersos no “simbólico”, primeiro criadores de mitos e, mais tarde, da própria filosofia.
Trata-se portanto, como tem sido notado tantas vezes, de uma versão laica, racionalizada, “científica”, do livro da Génese, e portanto de uma das problemáticas mais constantes da nossa consciência ocidental.  São suas temáticas, por exemplo: que significa ser-se humano, “civilizado”, o que é o laço social que nos distingue das comunidades animais, o que implica falar, usar a/ser-se usado pela linguagem, qual o papel da fabricação de utensílios e de todo o tipo de “externalidades” relativamente ao corpo (e dos seus contextos de “produção”, é claro) – como por exemplo a produção do espaço e da arquitectura - na própria constituição de uma comunidade humana, etc, etc.  Tópicos sobre os quais já os gregos pensaram, quer em termos de mitos, quer depois em termos de filosofia. Tópicos que nos continuam a dar que pensar.
Independentemente de muita arqueologia se ter feito e ainda continuar a fazer de acordo com pressupostos do senso comum, de um “realismo” ou positivismo ingénuos, etc., ou então de evitar mais ou menos intencionalmente as questões “filosóficas”, opção agora mais reforçada pelas condições objectivas extremamente negativas com que as pesquisas em geral se deparam, importa continuar a dizer a velha frase: “nada há de tão prático quanto uma boa teoria”.
Há evidentemente que aproximar/conjugar as “culturas” (ciências e “letras”), evitar a armadilha de uma arqueologia tecnocrática (supostamente progredindo apenas por “aplicações” das “ciências”) e perceber ao mesmo tempo que a filosofia transbordou para fora de si própria, e não é um “campo” (como aliás todos os outros) fechado. E por isso também se optou aqui por utilizar a expressão “pensamento crítico”, mais abrangente e interventivo, para alguns, ou pelo menos à primeira vista, do que a palavra “filosofia” poderia eventualmente pressupor.
Não se deve confundir, porém, esta noção abrangente e necessariamente convencional de “pensamento crítico” em ciências sociais e humanas e estudos conexos (na verdade, reconheço, tão vaga que alguns a não aceitariam) com as perspectivas próprias da “teoria crítica” associada à chamada “escola de Frankfurt”, em particular representada pelos trabalhos de Adorno e Horkheimer, e de que Habermas é um representante mais recente. Esta última, quando muito, pode ser vista como uma das formas que o pensamento crítico contemporâneo assumiu, numa vastíssima constelação problemática, mas onde é muito importante algum radicalismo e a vontade de unir teoria e prática política, num sentido emancipatório que nos livre dos horizontes da ideia de “fim da história” propalada por muitos em relação com o término da “guerra fria” e o colapso do sistema falsamente “comunista” da União soviética.
Mais do que nunca, neste momento de crise estrutural do próprio modelo societal que criámos, somos obrigados a repensar tudo desde a raiz, tanto na nossa prática de arqueólogos como na nossa vida. Não é de economia que se trata, claro, é em termos de modelo de sociedade que de novo hoje temos que radicalmente pensar, pois parece esgotado o “ciclo” que podemos designer capitalista, pelo menos como ideal emancipador, e não há para ele uma teoria geral de substituição, mas apenas se nota na maior parte dos que pensam uma conformação geral com a ideia de “reforma”, que parece cada dia mais utópica, ou totalmente impossível. O colapso em que entrámos não tem ponto de retorno à vista.
A atitude crítica moderna parte já de Kant, que operou “uma revolução [copernicana] na maneira de pensar de uma importância decisiva.” (Tunhas, op. cit., p. 224), de que ele mesmo tinha consciência, através de uma obra sistemática que abarca todos os grandes temas filosóficos, dando um enorme “salto” em relação a Descartes. Realmente, os seus três livros de “crítica” (…) “investigam quais as condições de possibilidade do nosso conhecimento, quais os seus limites e qual a estrutura do nosso espírito requerida para que tal conhecimento se produza.” (id, ib.). O sujeito é colocado por Kant “no centro do próprio processo de conhecimento.” (id, p. 226), tratando-se de esclarecer quais os princípios organizadores da experiência. Pelo menos uma parte significativa da filosofia posterior não pôde ignorar a obra de Kant, a qual “(…) em virtude da própria afirmação da incognoscibilidade das coisas em si, proibia qualquer conhecimento do Absoluto.” (Tunhas, p. 243).
Tenhamos sobretudo presente que a crítica, num sentido kantiano, é uma investigação sobre as possibilidades do conhecimento.
Desde os fins do séc. XVIII o tema da evolução e do progresso histórico tomam uma importância grande, que vem desembocar em Hegel e Marx no séc. XIX, a par do evolucionismo das ciências naturais, com Lamarck e Darwin. Estas “correntes”, ligadas ao antiquarismo e à etnologia nascente, tiveram aliás e como é bem sabido muita importância na emergência da ideia de pré-história tal qual ainda hoje vulgarmente a concebemos.
Uma das formas que assume aquilo que podíamos chamar a “consciência crítica” moderna é a aguda percepção, ou suspeita (generalizada a muitas pessoas, pois que em certas minorias “intelectuais” estas questões ou outras comparáveis há muito ocorriam, embora formuladas de diferentes maneiras) de que o que aparece à nossa percepção/compreensão imediata é sinal ou sintoma de algo de mais subtil, invisível, escondido, antigo, “arcaico”, ou profundo. Ou seja, com o jogo da aparência/verdade, da presença/ausência, afinal uma problemática que em última análise num certo sentido “repete” Platão. O que tem tudo a ver, evidentemente, com a arqueologia (basta ler Julian Thomas, “Archaeology and Modernity”, Londres, Routledge, 2004).
Aí a influência de Saussure e do seu “Curso de Linguística Geral” (publicado em 1916), entre muitas outras, foi bastante grande. Como escreve Tunhas (op. cit, p. 337), “De acordo com a opinião comum estruturalista (…) o sujeito é um efeito de superfície determinado por uma estrutura da qual, por definição, ele não se encontra consciente, e o trabalho filosófico consiste em conhecer essa estrutura.” Mas essa estrutura profunda “(…) está longe de ser propriedade exclusive do estruturalismo. O marxismo, bem entendido, já havia identificado a estrutura profunda com o modo de produção e a superfície com todo o aparato do direito, da religião, da arte, etc. Do mesmo modo, Freud distinguirá o conteúdo manifesto do sonho e o seu conteúdo latent, constituindo este, que a análise deverá decifrar, o verdadeiro pensamento do sonho. Russell, e o Wittgenstein do “Tratactus”, procuravam a “forma lógica” por detrás da enganosa “forma gramatical”. E a gramática generativa de Noam Chomsky (…) buscará também a “estrutura profunda” da linguagem.)”
Um dos aspectos mais pertinentes para nós, arqueólogos, do pensamento crítico contemporâneo, tal como ele nos aparece em autores como Walter Benjamin (as famosas teses sobre a história) ou Giorgio Agamben (“Infância e História”, por exemplo, livro de 1978, mas traduzido para francês em 1989 – Paris, Payot; ou ainda “Signatura Rerum”, Paris, Vrin, 2008, sobretudo pp. 93-128 – cap. “Archéologie Philosophique”), é a forma de conceptualizar a história, a memória, as relações entre passado, presente e futuro. Outra, é a interface homem-animal, conceptualizada entre muitos por Agamben também, num livro já traduzido em Portugal pelas Edições 70, “O Aberto” (com reimpressão em 2012).
A história sequencial faz parte do pensamento metafísico ocidental, que tantos autores contemporâneos (Heidegger foi certamente um deles, e, até certo ponto na sua esteira, Derrida um outro, entre muitos) tentaram, quiçá em vão, superar.
Por mim, estudando filosofia “às arrecuas” (ou seja, escolhendo autores contemporâneos cuja problemática me toca, e de cujas fontes de inspiração vou depois, por tentativa e erro, procurando acercar-me) tenho vindo a interessar-me particularmente pela obra do esloveno Slavoj Zizek, um filósofo hegeliano que pôde compreender Jacques Lacan (o psicanalista que trouxe Freud e a psicanálise definitivamente para a filosofia) através do seu “herdeiro” Jacques Alain-Miller, e assim faz uma conjugação particularmente original e, aos meus olhos de “estudante”, muito perspicaz, de teoria lacaniana com um novo hegelianismo que tem vindo a surgir nas últimas décadas.
Por exemplo, a ideia, que ainda nos apresenta um autor sério como Paulo Tunhas (op. cit., pp. 243 e segs.) de um Hegel, sem dúvida o máximo expoente do idealismo alemão, como tendo desenvolvido uma teoria do desenvolvimento histórico (a qual, sem dúvida, vai influenciar Marx) e que tende para um sistema fechado e absolute, não é bem aquela que corresponde à que desenvolve Zizek.
Este autor (como a citação inicial destes tópicos exprime) defende que é preciso ler os autores com os olhos do presente, quer dizer, fazê-los dizer o que “eles não sabiam que sabiam”, noção que corresponde bem a uma (contra-intuitiva) causalidade retrospectiva que me parece muito frutuosa (os acontecimentos “criam” as suas causas, o que vem depois é um revelador do que aconteceu antes, postula as suas próprias causas, por assim dizer).
Por exemplo, quando Marx referia, inspirando-se em Hegel (e retiro esta ideia de Zizek, que a refere muitas vezes), que a anatomia do homem nos fornece a chave para compreender a anatomia do macaco, estava em causa essa visão de que a “verdade” de uma coisa se “revela” nos seus “desenvolvimentos” ulteriores. Ou seja, o que foi contingente passa depois, retrospectivamente, e de certo modo, a aparecer como “necessário”. O presente interage dialecticamente com o passado, não tanto no sentido de tese- antítese-síntese (afirmação- negação- negação da negação) com vista a um todo harmonioso e uno, mas no sentido de uma “negação reveladora”, que “descobre” no passado o que ele mesmo continha como potencial, potencial esse porem que não “estava lá”, mas só aparece depois como potencial, no futuro.
Ou noutro exemplo, escreve Zizek: (2012, v. adiante, p. 245): “(…) na análise do universo do Capital, nós não devíamos apenas empurrar Hegel na direcção de Marx, mas o próprio Marx devia ser radicalizado: só hoje, com o capitalismo global na sua forma “pós-industrial” é que, para o dizer em termos hegelianos, o capitalismo está a chegar ao nível da sua própria noção. (…) ou seja, para conseguir descrever a estrutura da noção inerente de uma formação social, devemos começar pela sua forma mais desenvolvida.” Por outras palavras, a “história” só se compreende retrospectivamente.
Esta ideia articula-se bem, até certo ponto, parece-me, com as reflexões críticas de Agamben sobre a história, só que estas, creio, não vão talvez tão longe quanto as de Zizek, no seu potencial revolucionário.
A obra deste autor é gigantesca, mas o seu último livro, que corresponde a um enorme esforço de concatenação das suas ideias (mais de 1000 pp.) é “Less Than Nothing. Hegel and the Shadow of Dialectical Materialism” (London, Verso, 2012), e parece-me crucial.
Vendo na obra de Hegel o que Hegel não podia ter “visto” no seu tempo (um grande dinamismo, e não uma síntese aconchegadora), e vendo no ensino de Lacan (filtrado por Miller, é certo, dado que Lacan nunca quis ser um autor publicado, sempre recusou o discurso do mestre e o discurso universitário) o que o próprio Lacan por vezes não consciencializou (por exemplo, o seu profundo hegelianismo, nomeadamente na fase tardia em que Lacan nunca refere Hegel), Zizek dá-nos o embrião de uma visão nova e corajosa do ser humano, da sociedade, da história, da acção política, da necessidade da acção emancipatória.
Esta minha intervenção tem a intenção, como estudante de Zizek, de chamar mais uma vez a atenção para o lermos no que ele tem de mais “sério” (para além dos aspectos superficiais criados pela sua aparição nos media), e assim abrirmos o debate, também em arqueologia, em relação com os grandes problemas do nosso tempo, criando espaço para o pensamento. Pois que, precisamente em épocas de crise, quando o poder existente nos incita a actuar, nos incita ao diálogo (para nos chamar ao seu campo de jogo, no qual estamos à partida vencidos), é crucial mostrar que o mais urgente é suspender (suspensão, a que os gregos chamavam “epoché”) a urgência com que o poder nos chama à liça. Criar uma pensamento/praxis alternativo das alternativas que, até agora, todas falharam na criação da “comunidade por vir”, porque enquadradas na moldura da democracia burguesa e do pensamento liberal, tolerante e consumista (pensamento/acção alienados).
E a quem nos chamar loucos ter a coragem de referir que uma tomada de decisão (neste caso, pensar criticamente e radicalmente) é e foi sempre até certo ponto um acto de “loucura”, pois que jamais um ser humano ou uma organização decidem com base na ponderação de todos os efeitos que essa decisão pode acarretar, pela razão simples de que (nomeadamente numa situação complexa, sistémica) jamais é possível tal conhecimento antecipado. Se ele fosse possível, a política reduzia-se à administração, que é aquilo a que nos querem conduzir na sociedade digital em que vivemos.
Recusar, também em arqueologia, um modelo gestionário de sociedade e, no plano da pesquisa e da actuação social, descentrar-nos relativamente a um modo de estar dominante, que se limite a alimentar as indústrias do património, por um lado, e por outro  preencha uma narrativa histórica linear, enfadonha e impotente, que objectivamente serve de enquadramento ideológico daquelas indústrias – eis o que pretendo sugerir.

voj loures outubro 2012

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Conferência


Conferência


ASSOCIAÇÃO DOS ARQUEÓLOGOS PORTUGUESES
SECÇÃO DE PRÉ-HISTÓRIA
Conferência
ALGUMAS PROPOSTAS PARA UM ENCONTRO URGENTE: Arqueologia e Pensamento Crítico Contemporâneo
pelo
Professor Doutor Vítor Oliveira Jorge (prof. cat. aposentado da FLUP)
25 de Outubro de 2012 18 horas – Entrada Livre Museu Arqueológico do Carmo – Lisboa

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Conferência em Coimbra, por Vítor Oliveira Jorge (resumo)

Coimbra, 5 de Junho de 2012 – conferência (resumo)

A arqueologia do ponto de vista do pensamento crítico contemporâneo: alguns tópicos

por

Vítor Oliveira Jorge

Professor catedrático aposentado da Faculdade de Letras da Universidade do Porto; investigador do CEAUCP

Creio que a publicação, em 2004 (Londres, Routledge), do livro “Archaeology and Modernity”, pelo meu colega Julian Thomas, da Universidade de Manchester, marca uma importante ruptura com as reflexões anteriores, mesmo dos autores ditos “pós-processuais”, percebendo que a renovação da arqueologia e da teorização da sua prática tem de se compreender “de fora” da disciplina. A arqueologia é um produto da modernidade, e esta tem sido analisada e pensada por numerosos autores que não podemos ignorar, e que continuam a aparecer constantemente. Muitos desses autores não se apresentam propriamente como “filósofos, ou teóricos desta ou daquela área do saber, mas questionaram a própria maneira como a produção do saber costumava ser questionada/teorizada. Ou seja, pensar a arqueologia hoje é uma tarefa muitíssimo mais exigente do que há algumas décadas. Implica uma postura de inter e transdisciplinaridade radical, muito difícil de conseguir, porque obviamente se tem de partir dos problemas da arqueologia e, ao mesmo tempo, conseguir vê-los a partir de fora, como se não fôssemos arqueólogos. Exercício quase acrobático, porque o discurso arrasta-nos sempre para o senso comum vigente. É isso que se pode considerar uma postura crítica, absolutamente básica para se conectar a arqueologia com o conhecimento contemporâneo e para lhe permitir o diálogo com as grandes questões políticas, filosóficas, científicas que se nos colocam na era pós-moderna do capitalismo financeiro neoliberal.

Falta talvez fazer qualquer coisa como um livro chamado por exemplo “Arqueologia e Pós-Modernidade”, prolongando a obra de J. Thomas, e entendendo por pós-modernidade uma palavra convencional que designa o facto de, não se tendo cumprido muitos ideais da modernidade, estarmos numa época em que o ideário do mercado, do empreendedorismo, das sociedades de controlo extremamente subtil e invasor corta com esse próprio ideário da “primeira modernidade”. Sem conhecer (o que não significa subscrever, é óbvio) as reflexões de pensadores como, por exemplo, Jacques Derrida, Giorgio Agamben, ou Slavoj Zizek, entre imensos outros, é minha convicção de que não só não percebemos o mundo em que nos encontramos, como não entendemos por que razão a universidade continua a legitimar (e a legitimar-se) numa visão da história que é anacrónica, enganadora, diria mesmo perigosamente conservadora, e que, reflectida em arqueologia (ainda muito enfeudada à prática histórica) leva a uma situação de impasse entre as indústrias do património (que vendem às massas um passado domesticado), os trabalhos de pesquisa por projectos curtos (tipo mestrados/doutoramentos de Bolonha, etc) que em geral produzem mais do mesmo à pressa, ou o trabalho empresarial na sua maioria preso à mesma lógica de “curto-prazismo” própria do sistema em que estamos mergulhados. Mas a história não parou, nem muitos de nós, seres humanos, se recusaram a pensar para fora das fronteiras deste horizonte imperial que se pretende apresentar como natural, indesmentível, inequívoco, quiçá eterno. Sem cair na pressa das soluções rápidas, que se situam na mesma lógica e portanto se sujeitam à carnavalização do adversário, há que ousar pensar uma nova arqueologia para uma nova forma de comunidade que, por vias travessas talvez, é uma comunidade que há-de vir.

O pensamento crítico contemporâneo coloca os problemas radicais que são os que podem motivar uma arqueologia adulta, liberta da tutela da história narrativa, sequencial, teleológica, legitimadora de uma concepção do tempo banal e retrógrada, como já Walter Benjamin apontou.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Colóquio Giorgio Agamben - programa


Programa

Colóquio/jornadas de estudo

sobre o pensador italiano contemporâneo

Giorgio Agamben

(n. 1942)

http://www.iep.utm.edu/agamben/ (2005)

http://en.wikipedia.org/wiki/Giorgio_Agamben (2012)

http://fr.wikipedia.org/wiki/Giorgio_Agamben (2012)

http://www.egs.edu/faculty/giorgio-agamben/biography/

http://www.facebook.com/profile.php?id=1731452550#!/events/235722089848171/

Dias 8 e 9 de Março de 2012 – Centro Unesco do Porto – R. José Falcão, 100 – colaboração da Fundação Eng.º António de Almeida, Porto – organização da SPAE e da ADECAP (associações científicas e culturais sem fins lucrativos sedeadas no Porto).

http://sociedadeportuguesaantropologia.blogspot.com

http://www.facebook.com/profile.php?id=1731452550#!/pages/Spae-Sociedade-Portuguesa-De-Antropologia-E-Etnologia/242375295851375

http://adecap.blogspot.com

http://www.facebook.com/profile.php?id=1731452550#!/pages/Adecap/283944584999116

Entrada livre sem necessidade de inscrição prévia

Coordenação conjunta de

Vítor Oliveira Jorge

http://www.facebook.com/profile.php?id=1731452550#!/profile.php?id=1731452550

E

Luís Carneiro

http://www.facebook.com/profile.php?id=1731452550#!/templesein



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Dia 8. Quinta-feira

9h00 Vítor Oliveira Jorge – Breve apresentação de Giorgio Agamben na perspectiva de uma pessoa sem formação em filosofia: por que interessa tanto a todos este pensador contemporâneo?
9h30 Luís Carneiro – Breve apresentação geral da obra/perfil filosófica/o de Giorgio Agamben

10h00 Cíntia Gil - Considerações sobre o contemporâneo
10h30 Gonçalo Leite Velho - Indelével: Gesto, Memória e Cinema


Debate (11h00-13h00)

15h00 André Dias – Contra a vontade

15h30 Rossana Mendes Fonseca – Assinatura, Enunciado, Arquivo

16h00 Viriato Porto - A comunidade que vem, ou o pós-anarquismo de Agamben


Debate (16h30-18h00)
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Dia 9. Sexta-feira

9h00 Maria José Barbosa - A experiência como mistério – leitura da história segundo Agamben
9h30 Joana Alves Ferreira - Homo qua Homo. O lugar singular de um corpo aprisionado. A obra O Aberto de Giorgio Agamben no contexto da relação entre homem e natureza, entre homem e técnica e entre natureza e história
10h00 Ana Vale - Paradigma e emergência em Arqueologia. Uma leitura dos textos: O que é um paradigma e Arqueologia Filosófica de Giorgio Agamben

10h30 Sérgio Gomes - O Passado, os Indícios e as Pistas: um cruzamento da leitura de Giorgio Agamben, Michel de Certeau e Tim Ingold


Debate (11h00-13h00)

15h00 Pedro A.H. Paixão - A questão das «medialidades puras» em Giorgio Agamben
15h30 Jorge Leandro Rosa - O messiânico como crise do pacto arcaico
16h00 António Caselas - A vida indomável, para além da regra e do direito Debate final (16h30-18h00)

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Colóquio/Jornadas de estudo sobre Giorgio Agamben


Colóquio/Jornadas de estudo sobre

Giorgio Agamben


Centro Unesco do Porto (R. José Falcão, 100), 8 e 9 de Março de 2012

Organização conjunta da SPAE e da ADECAP

Com a colaboração da Fundação Engº António de Almeida

Coordenadores: Vítor Oliveira Jorge (FLUP – prof. reformado) e Luís Carneiro (FLUP – mestrando em Filosofia)

Entrada livre

(as despesas de deslocação, estadia e alimentação estarão a cargo dos participantes, tanto oradores convidados como auditores. As associações organizadoras terão o gosto de oferecer aos oradores –incluindo os dois coordenadores, que apresentarão também cada um a sua reflexão, num total de 10 - uma refeição ligeira ao almoço de cada dia, condicionada a um menu pré-fixado, dada a chamada “crise” que atravessamos e o facto de não contarmos em princípio com apoios financeiros)

Metodologia:

Cada interveniente abordará um livro/tema da obra de Giorgio Agamben, tanto no seu conteúdo como, se o desejar, nas suas repercussões noutros autores. Não se pretende uma exposição académica do pensamento de um pensador vivo e tão diversificado como Agamben, mas antes uma reflexão transdisciplinar sobre a sua obra já publicada, a partir de temáticas/obras consideradas vitais para o entendimento do seu trajecto e repercussão no pensamento contemporâneo.

Objectivo:

Troca de ideias sobre e a partir do pensamento do filósofo italiano Giorgio Agamben, não de forma “académica”, nem exaustiva, mas crítica, e feita de modo rigoroso e sobretudo motivador em termos transdisciplinares. Cada orador/expositor tem assim a liberdade de abordar o tema que melhor lhe aprouver, podendo até o mesmo tema ou livro ser alvo da atenção de mais de um orador.

Esquema logístico de funcionamento (horários a procurar cumprir de modo a aproveitar o melhor possível o tempo):

Dia 8, quinta-feira

9 h – abertura dos trabalhos, com intervenção de cada um dos coordenadores

10 h. -10,30 h – apresentação 1

10,30 h – 11 h. apresentação 2

11 h- 11,15 h – intervalo

11,15 h – 13 h. – debate

15 h – 15,30 h. – apresentação 3

15,30 h. -16 – apresentação 4

16 h – 16,15 h. intervalo

16,15 h- 16,45 h – apresentação 5

16,45 h – 18 h. – debate final do dia

Dia 9, sexta-feira

10 h. -10,30 h – apresentação 6

10,30 h – 11 h. apresentação 7

11 h- 11,15 h – intervalo

11,15 h – 13 h. – debate

15 h – 15,30 h. – apresentação 8

15,30 h. -16 – apresentação 9

16 h – 16,15 h. intervalo

16,15 h- 16,45 h – apresentação 10

16,45 h – 18 h. – debate final do Encontro